Entre as diligências canceladas pelo ministro do Supremo também está a coleta de evidências no material apreendido pela Operação Lava Jato que poderia contribuir com o esclarecimento do caso.
Ao suspender as diligências do inquérito
contra o senador Aécio Neves (PSDB-MG), o ministro Gilmar Mendes, do Supremo
Tribunal Federal (STF), cancelou os depoimentos do parlamentar e de
testemunhas, inicialmente marcados para cumprimento em 90 dias, e a coleta de
evidências na documentação e arquivos apreendidos pela Operação Lava Jato que
pudessem contribuir no caso.
Na
decisão que barra o avanço do inquérito e manda o pedido de apuração de volta
para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para sua reavaliação, o
ministro considerou não haver elementos novos que justificassem a continuação
da investigação. Entre a abertura do inquérito para investigar o senador e o
cancelamento das diligências foram cerca de 24 horas.
Uma das bases do pedido de Janot é a delação do senador
cassado Delcídio Amaral (ex-PT-MS), em que ele liga Aécio Neves à suposta
corrupção na estatal de energia em Furnas. A outra é a Operação Norbert,
deflagrada no Rio. Na petição ao Supremo, por meio da qual pede abertura de
inquérito contra o senador tucano, Janot afirmou que a investigação sobre a
suspeita de corrupção ‘merece reavaliação’.
Em março de 2015, o Supremo arquivou, a pedido do próprio
Janot, a investigação sobre o presidente nacional do PSDB. O procurador apontou
‘inexistência de elementos mínimos’. Naquela época, os investigadores tinham em
mãos a delação premiada do doleiro Alberto Youssef, personagem central da
Operação Lava Jato, citando Aécio.
Delcídio Amaral disse que ‘sem dúvida’ o tucano recebeu
propina em um esquema de corrupção em Furnas que, segundo o ex-líder do Governo
Dilma Rousseff, era semelhante ao da Petrobrás, envolvendo inclusive as mesmas
empreiteiras.
O ex-senador, cassado na semana passada por suspeita de
tramar contra a Lava Jato, tem experiência no setor elétrico, conhece o
ex-diretor de Engenharia de Furnas Dimas Toledo, apontado como o responsável
pelo esquema de corrupção, e disse ter ouvido do próprio ex-presidente Lula, em
uma viagem em 2005, que Aécio o teria procurado pedindo que Toledo continuasse
na estatal.
Janot afirmou ao Supremo. “Diante do novo depoimento,
colhido no bojo da colaboração celebrada por Delcídio do Amaral, no qual trata
dos mesmos fatos agora, sob a perspectiva de alguém que ocupava uma posição
privilegiada no que diz respeito ao conhecimento dos fatos, o quadro merece
reavaliação.”
Segundo o procurador-geral, a versão apresentada por
Delcídio, ‘que se agrega ao anterior relato de Alberto Youssef, mostra-se
plausível’. Janot sustenta que ‘orbitam em torno de ambos os relatos alguns
elementos confirmatórios’.
No documento ao Supremo, Janot cita uma denúncia do
Ministério Público Federal contra o ex-diretor de Furnas Dimas Fabiano Toledo e
contra Airton Antonio Daré, em 2012, perante a 2ª Vara Federal do Rio ‘por
participação num esquema de arrecadação de vantagens indevidas (propinas) no
âmbito de Furnas, custeadas mediante superfaturamento de obras e serviços’.
A denúncia, afirma Janot, posteriormente declinada à
Justiça Estadual, ‘narra modus operandi muito semelhante ao noticiado pelos
colaboradores Alberto Youssef e Delcídio do Amaral, com o pagamento de
vantagens indevidas para servidores públicos e políticos no âmbito da empresa
Furnas por empresas interessadas em contratar’.
“Há menção ao ex-diretor de Furnas, Dimas Fabiano Toledo.
Este seria o responsável por gerenciar uma espécie de ‘fundo’ de valores
ilícitos, que eram recursos disponibilizados a políticos para financiar
campanhas”, aponta o procurador-geral da República.
“Ouvido no Inquérito 1835/2005 perante a Polícia Federal
do Rio de Janeiro em 10 de fevereiro de 2006, Dimas Fabiano Toledo afirmou que
conhece o então governador de Minas Gerais Aécio Neves e que este último
‘costumava procurar o declarante em Furnas para assuntos envolvendo os
municípios onde o atual governador tinha base eleitoral’, que ‘mantém com o sr.
Aécio Cunha [pai de Aécio Neves], conselheiro de Furnas, relação de amizade, já
que o avô do declarante já era companheiro de partido do avô de Aécio Cunha.”
Ao Supremo, Janot citou ainda a irmã do presidente
nacional do PSDB. “A irmã de Aécio Neves, mencionada por Delcídio do Amaral e
Alberto Youssef, possui (ou ao menos possuía) diversas empresas em seu nome e,
na época dos fatos, mantinha inclusive empresa de factoring, criada em 1993 e
que teve atividades ate 2010, conforme pesquisa na Junta Comercial de Minas
Gerais.”
O procurador apontou também a Operação Norbert, que
tramitou perante a Justiça Federal do Rio. Na ação, foram apreendidos ‘diversos
documentos, por ordem judicial, na casa dos doleiros Christiane Puchmann e
Norbert Muller’.
“Referidos documentos revelaram que diversas pessoas,
valendo-se das atividades dos doleiros, criaram mecanismos de interposição de
personalidade jurídica, com o intuito de manter e ocultar valores no exterior,
inclusive na Suíça e no Principado de Liechtenstein, na Europa. Como fruto das
referidas apurações, o Ministério Público Federal no Rio de Janeiro ofereceu
denuncia em face de Christine Puschmann (vúuva de Norbert Miiller) e suas
filhas Christine Miiller e Ingrid Maria Miiller Lusguinos”, destacou o
procurador.
O inquérito, que fazia referência à Inês Maria Neves
Faria, mãe do senador Aécio Neves, foi posteriormente arquivado. De acordo com
o Ministério Público Federal no Rio o arquivamento ‘alude ao fato de os valores
dos depósitos no exterior serem inferiores àquele fixado pelo Banco Central
como de comunicação obrigatória, além da inviabilidade de colaboração
internacional [com Liechtenstein] com o fim de dar prosseguimento às
investigações’.
Quando o inquérito foi aberto, o senador Aécio Neves se
manifestou desta forma:
O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), divulgou
nota na quinta-feira, 12, e voltou a chamar de falsas as acusações feitas
contra ele pelo ex-senador Delcídio Amaral (sem partido-MS) em delação premiada
no âmbito da Operação Lava Jato.
“Quando uma delação é homologada pelo Supremo Tribunal
Federal, como ocorreu com a delação do ex-senador Delcídio Amaral, é natural
que seja feita a devida investigação sobre as declarações dadas. Trata-se de
temas que já foram analisados e arquivados anteriormente”, diz o comunicado. “O
senador Aécio Neves tem convicção de que, como já ocorreu no passado, as
investigações irão demonstrar a falsidade das citações feitas.”
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