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14 outubro 2018

É correto que um juiz determine a alguém que se abstenha de falar algo?

Recentemente Jair Bolsonaro teve o seu pedido consistente em que Jean Wyllys se abstivesse de fazer comentários pejorativos sobre sua pessoa negado pelo TJ-RJ. Mas então, a decisão dos desembargadores está correta? Qual o seu fundamento jurídico e o seu impacto no Estado Democrático de Direito?

Salientando que não será feito comentários acerca da conduta de nenhum político, pois, o caso em comento serve, tão somente, para ilustrar o que será discorrido neste breve artigo. A questão aqui será iminentemente de direito, e não política.
Recentemente o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro manteve decisão de primeira instância que negou o pedido de Jair Bolsonaro consistente na determinação de que Jean Willys se abstivesse de realizar comentários pejorativos contra sua pessoa.
O pedido e a decisão não deixaram de gerar polêmicas e suscitar dúvidas acerca da sua possibilidade e legalidade. Afinal, pode um juiz determinar que alguém se abstenha de falar algo?
A Lei nº 5.250/67, popularmente conhecida como “Lei de Imprensa”, nascida para “regular a liberdade de manifestação do pensamento e de informação”, por muitas vezes foi utilizada como fundamento para determinar que alguém se abstivesse de realizar comentários depreciativos contra determinadas pessoas, de modo a impor limites ao exercício do direito de expressar certas opiniões.
No entanto, no início de 2009, o Supremo Tribunal Federal concluiu, em sede de controle concentrado de constitucionalidade no âmbito do julgamento da ADPF nº 130, que a Lei de Imprensa não é compatível com a Constituição Federal, deste modo, decisões que imponham em abstrato a abstenção de proferir determinados comentários em virtude da possibilidade de futura violação a direitos da personalidade não merecem vida no mundo jurídico, pois constituem censura prévia, o que é vedado pelo art. IX, da Constituição Federal.
A observação do Ministro Celso de Melo na decisão liminar nos autos da Rlc nº 18.566 MC coaduna com o entendimento acerca da impossibilidade de determinação de abstenção:
O exercício de jurisdição cautelar por magistrados e Tribunais não pode converter-se em prática judicial inibitória, muito menos censória, da liberdade constitucional de expressão e de comunicação, sob pena de o poder geral de cautela atribuído ao Judiciário qualificar-se, perigosamente, com novo nome de uma inaceitável censura estatal em nosso País. Rlc nº 18.566 MC. 12/09/2014.
Deste modo, entende-se como inadequadas as decisões judiciais que importem na determinação de que indivíduos se abstenham de fazer comentários injuriosos, caluniosos e difamatórios, pois se permitido fosse, estaríamos claramente diante da censura prévia, em virtude da impossibilidade da parte compelida à abstenção ter certeza acerca do que constituiria ou não violação à decisão judicial.
O receio em falar para não descumprir o ato decisório consistiria em um verdadeiro resfriamento da liberdade de expressão (chilling effect), o que seria danoso não somente para a parte condenada, mas também para toda a sociedade que eventualmente poderia ser vítima do mesmo temor em expressar-se.
Cada violação de direito da personalidade em virtude do exercício excessivo da liberdade de expressão deve ser tutelada a posteriori, ou seja, quando verificada a ocorrência do ato ilícito, onde será possível mensurar a dimensão do dano, o dever de reparar e o tamanho de eventual indenização.
Deste modo, para tutelar o bem jurídico da liberdade de expressão, a jurisprudência do Supremo caminhou no sentido de garanti-la e livrá-la de qualquer imposições ao seu exercício.
Como garantia importante à sua proteção, no caso de violação do decidido na ADPF nº 130, cabe reclamação, diretamente ao Supremo Tribunal Federal, sem necessidade de se esgotar as instâncias ordinárias, objetivando a manutenção da autoridade das decisões da Corte Suprema, nos termos do art. 988III, do CPC.

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